segunda-feira, outubro 02, 2006

Corrupção: A nossa Al-Qaeda


Bin Laden não precisa de atacar Portugal, por cá temos uma imensa organização que provoca mais prejuízos ao país do que duas ou três bombas. Os dinheiros desviados do Estado permitiriam melhorar os cuidados médicos de forma a poupar muito mais vidas do que as que se perderiam com um dos seus atentados. A rede de padrinhos corruptos prejudicam muito mais a nossa economia ao asfixiar a concorrência e ao estimular os mais fracos do que o impacto negativo duma explosão. Bin Laden não precisa de atacar Portugal, nós já cá temos a nossa Al-Qaeda.
Bin-Laden não inventou nada com a sua Al-Qaeda, os nossos corruptos há muito que criaram uma estrutura assente no mesmo modelo orgânico da organização do terrorista saudita. A estrutura em células, o recurso privilegiado às comunicações informais, a multiplicação de células em torno dos mesmos princípios do Rizoma (de que o gengibre é um exemplo - de raízes horizontais e de solidariedades biológicas transversais), o silêncio dos seus membros, qual omerta siciliana, a transferência de dinheiro sem recurso ao sistema bancário, são as regras de funcionamento de uma imensa organização cujas estruturas se dissemina por toda a sociedade.
É uma organização que cresce graças ao que poderia designar como “efeito Valentim”, uma cadeia de relações humanas estruturadas a partir de trocas de favores, que cresce segundo o princípio de que o “amigo do nosso amigo, nosso amigo é”. Lembro-me de ter tido um colega que pertencia ao círculo de amigos de Valentim Loureiro, tinha tantas agendas de telefone que lhe sugeria que em vez de anotar os números seria mais fácil sublinhá-los na lista telefónica. Esse meu colega fazia todos os favores que podia, os que estavam ao seu alcance e os que poderia conseguir recorrendo às suas agendas.
Se na Al-Qaeda de Bin Laden os terroristas têm nos laços religosos, o elemento de identificação onde o íman desempenha um papel central, na nossa Al-Qaeda o íman é sustituído pelo amigo mais poderoso. Existem muitos no Fisco, no futebol, nas autarquias, nos partidos, na construção civil e no pato-bravismo em geral. Todos sabemos quem são os ímans da corrupção nessa grande "esfera armilar" que aqui até poderemos designar por "futebolítica". Não podemos provar nada, a sociedade tem medo deles, mas toda a gente sabe quem são e onde estão.
Desempenham um papel mais parecido ao do íman fundamentalista do que ao dos padrinhos da máfia siciliana, estes não se matam, não tentam dominar o negócio, são antes amigos, partilham a mesma “religião”, são solidários, os seus seguidores optam pela partilha e pelo entendimento em vez do conflito (que deitaria tudo a perder).
E enquanto a Al-Qaeda é visada por todos os meios de investigação, por todas as polícias, das conhecidas às secretas, a nossa Al-Qaeda beneficia de total impunidade.