sábado, março 01, 2008

Capitalismo de cantina


Uma das formas mais primária de exploração humana foi o colonialismo que ao longo da sua história evoluiu no modelo de exploração dos recursos naturais e dos povos colonizados. Na sua fase final, ultrapassado o tempo do esclavagismo, o capitalismo criou um dos modelos mais primários de mercado, a cantina. Os trabalhadores recebiam o magro salário e rapidamente ficavam dependentes do fiado da cantina, prisioneiros de uma dívida eterna ao patrão.

Nos países do ocidente este modelo desapareceu mais cedo, o desenvolvimento das economias e o medo do comunismo levou a que o modelo social se tornasse mais justo, a distribuição mais justa dos rendimentos promoveu o consumo, os trabalhadores passaram a ser também consumidores e sujeitos fiscais, de tal forma que para muitas empresas os trabalhadores são hoje mais importantes enquanto consumidores do que enquanto assalariados.

A melhoria dos rendimentos da generalidade dos trabalhadores depende mais da redução da carga fiscal ou dos preços dos bens de consumo, da energia ou dos serviços do que dos aumentos salariais. Os ganhos resultantes de aumentos ligeiramente superiores à inflação são substancialmente inferiores à perdas resultantes do aumento da carga fiscal (só o IVA aumentou nos últimos anos de 17% para 21%), do aumento generalizado dos preços dos bens de consumo e da energia e dos níveis elevados das taxas de juro reais praticadas pelos nossos banqueiros.

Não admira que Belmiro de Azevedo tenha vindo criticar as práticas da banca, que são as mesmas que o patrão da SONAE segue nos seus hipermercados ou na sua empresa de telecomunicações. Belmiro, que raramente o ouvimos protestar contra salários mais altos que resultariam num aumento de vendas das suas empresas, vem protestar contra os excessos da banca na cobrança de comissões, acusando os banqueiros de terem vida fácil.

Os nossos empresários já disputam entre eles para ver quem consegue vender os que os portugueses ainda conseguem comprar, os bancos cobram comissões gigantescas perante a passividade de Vítor Constâncio, as empresas de telecomunicações praticam o oligopólio perante a passividade da Autoridade da Concorrência e vendem gato por lebre na internet perante a distracção da ANACOM. Perante uma situação de crise já se acusam uns aos outros de roubar em demasia, como fez Belmiro em relação à banca.

Voltámos à lógica do capitalismo de capitalismo de cantina, só que agora os senhores não têm o exclusivo do consumo na sua fazenda, por isso mesmo já se zangam em público.