sexta-feira, janeiro 30, 2009

Estratégia manhosa

Vale a pena acompanhar o Caso Freeport centrando-nos na forma como as notícias são lançadas, ou seja na forma como é gerida as fugas ao segredo de justiça.

Tudo começou com uma notícia do SOL, antecedida por pré-notícias visando instalar a dúvida e a curiosidade. A primeira notícia lançava a suspeita, a segunda falava de um DVD e apontava Sócrates como suspeito. Tudo começava com uma suposta reunião, em que não se sabia muito bem quem teria estado presente, motivada pelo desespero de um representante da Freeport que se queixava de lhe querem extorquir dinheiro. Surgia o nome do tio de Sócrates. Tudo era apresentado como mais um sucesso do jornalismo de investigação de uma conhecida jornalista que os responsáveis do SOL tinham trazido do Expresso onde se tinha notabilizado pelo processo Casa Pia.

Nesta fase inicial insinuava-se que as investigações depois feitas pelo MP eram motivadas por um pedido da polícia britânica e que o MP havia avocado o processo porque na PJ (dependente hierarquicamente do MJ) nada tinha feito durante anos. Entretanto deixou-se de se falar no DVD ou nas motivações da tal reunião, a dúvida era a celeridade do processo.

O impacto foi mínimo mas a dúvida foi instalada, foi então que surgiram mais dados e noutros jornais, designadamente, o Público, a fuga de informações foi democratizada, depois de um jornal pertencente a accionistas ligados ao PSD passou a ser outro jornal da mesma área a beneficiar de primeiras páginas. Soube-se então que um primo de Sócrates, o neurónio criativo tinha mandado um mail a pedir (não se dizia muito bem o quê) a troco do favor que o tio de Sócrates tinha feito. O favor tinha sido uma reunião de alguém que se queixava de lhe estarem a tentar extorquir dinheiro.

Entretanto soube-se que o neurónio criativo tinha levado sopa e que a empresa tinha durado muito pouco, isto é, a gestão de influência tinha caído por terra, da mesma forma que caiu por terra o argumento ambientalista já que a Comissão informou que tinha arquivado a queixa da Querqus.

Mas os gestores da distribuição da informação confidencial sabem que este processo não pode ser gerido como o da Casa Pia, agora não há o risco de alguém se mexer e ser logo acusado de pedofilia por um puto que de repente reconheceu a sua cara num álbum de fotografias. Neste caso foi necessário gerir melhor os trunfos, não divulgar tudo de uma vez, desta forma prolongava-se a manobra no tempo e sempre se poderia apanhar alguma contradição nas declarações de Sócrates. O primeiro-ministro até caiu à primeira ao precipitar-se e fazer declarações, mas cedo percebeu a estratégia e passou a ter mais cuidado com as posições.

A opinião pública ainda não tinha mudado muito e depois de uma primeira ronda de investigações percebeu-se que o Ministério Público não iria fazer o jogo, desta vez não havia inspectores da PJ e os procuradores tinham a sua própria estratégia de investigação. Era necessário lançar mais dados nos jornais.

Satisfeito o SOL e o Público, com a TVI a fazer grandes manchetes com o que saia nos jornais sem pagar direitos de autor, tinha ficado de fora o Expresso e os órgãos de comunicação social de Pinto Balsemão. Se o Expresso teve a primeira página do processo Casa Pia, até porque o SOL nem existia na época, também não podia ficar de fora do negócio, mas havia um problema, o jornal só sai ao sábado e uma semana era muito tempo para esperar. Optou-se pela Visão, ficando o Expresso de fora desta manobra.

Foi então que saiu a informação da carta rogatória dos polícias ingleses, algo que há muito os gestores da manobra dispunham pois ninguém imagina que tivesse sido enviada esta semana por DHL para o director da Visão. Como as suspeitas não foram suficientes e os lucros do neurónio criativo não justificavam tanta agitação nada como os ingleses dizerem que Sócrates era o suspeito número um. Foi então que os herdeiros da revolta contra o mapa cor-de-rosa embandeiraram em arco, se os ingleses diziam que Sócrates era o suspeito número um então o melhor era dispensar qualquer investigação e declará-lo logo culpado, até porque os ingleses são honestos e infalíveis.

Como seria de esperar a Procuradoria-Geral respondeu com um comunicado e esclareceu que a tal carta rogatória dizia precisamente aquilo que constava numa carta rogatória enviada há muito tempo e à qual não tinha sido dada resposta. Foi então que a TVI teve direito à sua notícia de abertura informando que, ao contrário do que dizia a PGR, a carta vinha acompanhada de informação, uns números e mais qualquer coisa, isto é, a PGR também era suspeita de mentir.

Parece que querem saber as contas de Sócrates, mas ninguém se lembrou de que até um presidente de junta tem que mandar estes elementos para o Tribunal Constitucional, coisa que nem Miguel Sousa Tavares parece saber. Também ninguém se lembrou de dizer que se o dinheiro saiu de Inglaterra por algum lado passou e antes de virem investigar supostos suspeitos os ingleses poderiam ter investigado o rasto desse dinheiro. Se está numa conta bancária de Sócrates de alguma forma lá chegou e se veio de Inglaterra uma das pontas da meada está lá, não se percebendo porque querem procurar por outra ponta sem saberem se essa ponta está mesmo cá. E se em relação a Portugal se insinuou que a PJ paralisou o processo, o mesmo não se pode dizer dos ingleses que tiveram muito tempo ara investigar, mas parece que optaram por coçar os ditos cujos, só mandando a carta rogatória porque poderão ter percebido que a questão iria ser de novo suscitada.

Bem, que mais terão para lançar nos jornais depois de todas as manobras falhadas? Esta é a dúvida e uma pista para a resposta está na estratégia já ensaiada e que vai tendo eco nalguns blogues e mesmo na boca de Miguel Sousa Tavares, agora há que tentar afastar a procuradora encarregue do processo? A verdade é que essa procuradora tem vários processos importantes, como o BPN ou a Operação Furacão, e parece que a sua equipa não está feita com fugas ao segredo de justiça, daqueles processo nada transpirou para a comunicação social.

Não é difícil de adivinhar que agora vão tentar afastar a procuradora, o ideal seria a investigação ser feita com o objectivo de obter novos elementos para mandar para os jornais de forma a esvaziar a justiça e fazer um julgamento público, ainda antes das eleições, de ser feita qualquer acusação e da intervenção de qualquer tribunal. É Assim a justiça dos fascistas, ainda sem qualquer acusação, sem que alguém tenha sido constituído arguido reuniu-se um tribunal plenário onde alguns jornalistas decidiram fazer o papel de juízes dos tribunais plenários dos fascistas. Com uma pequena diferença, quem lhes leu a acusação nem teve a coragem de dar a cara como faziam os agentes da Pide, estes são ainda mais cobardes.

O mais grave é que vejo por aí muita gente que é democrata e que a troca de poder chegar ao poder se esquecem dos princípios e alinham na encenação.