segunda-feira, janeiro 12, 2009

Os tabus da esquerda


Na esquerda que gosta de se afirmar como esquerda, usando mesmo o termo política de esquerda para se demarcar da direita e dos que à esquerda são menos ortodoxos, só o PCP tem um programa coerente. Todavia o PCP ainda foi incapaz de encontrar soluções para os problemas que conduziram à queda do regime socialista nos países do Leste da Europa onde os mecanismos do planeamento se revelaram incapazes de se mostrar superiores ao mercado das economias capitalistas para regular a economia. As economias socialistas nuca resolveram, a título de exemplo, o problema dos sistemas de preços.

Todavia o PCP mantém-se firme nas suas convicções ideológicas defendendo um modelo de sociedade e de economia, já não sendo muito claro à forma como se processaria a passagem da democracia parlamentar para o modelo político preconizado pelo marxismo-leninismo. A única pista para a posição do PCP sobre esta questão resulta do apoio ao referendo com que Hugo Chavez pretendia manter-se no poder.

Percebendo as dificuldades em responder às dúvidas suscitadas por uma economia socialista e sem respostas para essas mesmas dúvidas os bloquistas optam por um programa soft, diria mesmo a uma versão light mais adequada à sua base social de apoio. São contra o mercado mas não são explícitos em relação ao que defendem e quanto ao modelo político nem se pronunciam. Ora, os seus fundadores, sejam os da versão m-l, sejamos trotsquistas, sempre defenderam posições mais duras e ortodoxas do que o PCP, que sempre designaram por revisionistas.

Sem um modelo político definido e politicamente assumido as nossas esquerdas acabam por não ter um projecto político coerente, ser de esquerda não é mais do que não ser de direita. Se a direita defende um determinado modelo para o ensino então ser de esquerda é defender o modelo oposto, o que no nosso caso é defender o que está. O mesmo sucede com a saúde e com muitos outros sectores, como a saúde, a segurança, a legislação laboral, a emigração, etc..

Se considerarmos que o nosso modelo económico e social ainda é marcado pelo pós 25 de Abril, compreende-se que para as esquerdas tudo o que signifique mudar este modelo é uma política de direita. Para a nossa esquerda o socialismo fica no fim de uma estrada em linha recta, onde não são admitidas paragens nem se aceitam curvas e contra-curvas. É como se caminhássemos em direcção ao paraíso.

Daí a que os projectos políticos da esquerda sejam tabus inquestionáveis, a “escola pública” ou o Sistema Nacional de Saúde, une todas as esquerdas sem que se ouse ou admite questionar, até os membros das corporações que sempre foram contra o modelo mas cujo estatuto económico depende da sua manutenção dão os braços ao PCP e ao BE para o defender. No caso das esquerdas do PS, que mais do que discordarem das políticas governamentais sofrem de um complexo de esquerda, a posição é ainda mais curiosa, tudo está bem se o “povo” não se opuser, só quando surgem as manifestações contra o encerramento da maternidade ou contra a avaliação dos professores percebem que as políticas seguidas são de direita, onde o povo está é necessariamente a esquerda, pouco importando que o povo tenha sido mobilizado pelo autarca caceteiro ou pela defesa de pequenos privilégios corporativos.

Desta forma as esquerdas não têm projecto político, limitam-se a defender este “capitalismo de esquerda”, até porque é o que mais se adequa à fixação do seu eleitorado. O PCP tem mais sucesso com as suas organizações sindicais com um modelo económico assente em sectores de mão de obra intensiva do que em empresas que dependem de profissionais qualificados, a todo os dias vemos o Bernardino Soares ou o Louçã a manifestar solidariedade à porta de fábricas têxteis, mas nunca os vimos à porta de um banco ou de uma tecnológica.

Mais do que servir o interesse dos trabalhadores o actual modelo laboral e o tipo de empresas de empresas que temos encaixa-se na perfeição na estratégia política de uma esquerda cujo modelo de organização político pouco ou nada mudou desde os finais do século XIX, em vez de mudarem de modelo e de ideologia querem assegurar-se que seja o modelo económico que não muda para melhor se encaixar nos seus axiomas ideológicos.