quarta-feira, novembro 23, 2011

A revolta que me vai na alma

Entrei no Estado por concurso e sem cunha, entrei para o ministério das Finanças porque em resultado da adesão faltaram funcionários, nunca recorri a um crédito do BPN nem comprei acções deste banco através do Oliveira e Costa, não fui contratado pela fundação de um qualquer merceeiro para manipular a opinião pública em favor dos seus interesses, nunca me corrompi, nunca meti uma cunha para alcançar o que quer que seja, nunca participei na vida política a troco de qualquer cargo, nunca concorri a qualquer lugar vantajoso, não inventei anos de serviço para me reformar aos 50 anos, não beneficiei que qualquer esquema de promoção fácil. Mas mesmo assim sou ofendido pelo governo que diz que ganho mais do que aqueles que todos sabem que há muito que não ganham menos do que eu, sou exposto como culpado por uma crise de que não sou responsável.

O banqueiro a quem confio as minhas poupanças foi um dos que fez chantagem sobre o governo para recorrer à ajuda externa, depois de décadas a exibir milhões e milhões de euros tributados com uma taxa de IRC mais baixa do que a que suporta o merceeiro da minha rua vem agora recorrer à ajuda dos contribuintes exigindo uma taxa de favor, depois de ter acusado o governo de não ter sido capaz de prever a crise e de evitar o endividamento vem agora reconhecer que o seu banco não tem capitais suficientes para garantir os créditos duvidosos que concedeu.

O híper-merceeiro de quem fui cliente durante anos e que graças ao crescimento do consumo exibiu lucros crescentes que lhe permitiram internacionalizar-se e conquistar mercados de dimensão muito superior aos nossos, vem agora acusar-me de ter causado a crise por ter consumido demais, porque durante anos lhe comprei mais do que devia ter comprado. Ele que à conta da internacionalização quase não pagou impostos por cá e mesmo assim ainda instalou a holding na Holanda, foi dos primeiros a exigir o recurso ao FMI e a aplicar um programa de aumentos dos impostos que pago e de redução do vencimento que recebo.

O candidato a primeiro-ministro que chorou lágrimas de crocodilo por ter deixado passar um OE com algumas medidas de austeridade e que ia deixando o país aos soluços quando lhe pediu desculpa, defende agora o empobrecimento dos portugueses que vivem de salários, corta brutalmente aos funcionários públicos e propõe que os do sector privado trabalhem mais quase um mês por ano à borla (cerca de 170 horas). O governo que era suposto defender a melhoria das condições de vida combina as políticas de Pinochet com as de Salazar e decide empobrecer-me mesmo desrespeitando a constituição e comportando-se como um governo de marginais.

O oportunismo é tanto que já empresários que se demarcam desta orgia de ataques a tudo o que cheire a pós 25 de Abril, o desrespeito dos princípios constitucionais por parte do Gaspar é de tal ordem que o Passos Coelho já nem fala na sua revisão, agora desobedece-lhe em nome da troika, a irresponsabilidade é tal que se usam argumentos que apenas visam dividir os portugueses, atirando uns contra os outros sem se preocuparem com os riscos de conflito que isso representa.

Começo a ter vergonha de Portugal e de ser português, começo a sentir uma grande vontade de sair, pedir a nacionalidade a outro país ou mesmo pedir asilo político nem que seja ao Burundi, isto começa a ser um país de cobardes governados por sacanas.