segunda-feira, junho 04, 2012

O país das Maravilhas (do Gaspar)


Quem ouve o Gaspar há dois países, o país AG e o país DG, no país antes do Gaspar era só desgraças, no país depois do Gaspar caminha-se para a redenção, somos todos Alices. Desde que é ministro que tudo está em linha com as previsões, todas as desgraças são sinais de que o paraíso está logo a seguir à próxima curva, todas as desgraças são passos necessários para se ter direito ao paraíso.
  
A formação profundamente católica do ministro (que deve ter tido uma excelente nota a catolicismo na Universidade Católica) leva a que no imenso laboratório social em que transformou o país tudo se explique por velhas máximas, a austeridade resulta de comportamentos pecaminosos enquanto consumidores, os sacrifícios levam à redenção.
  
Mas o que mais impressiona neste ministro é a total ausência de preocupações sociais, o desprezo pelos seus concidadãos, é-lhe totalmente indiferente que o empobrecimento forçado que escolheu para alguns os leve a perder a casa, a deixar de ir à consulta, a tirar o filho da universidade ou a deixar de comprar os medicamentos. O aumento brutal do desemprego só o preocupa porque tem de monitorizar de perto a despesa com subsídios de desemprego, talvez porque já tem preparado um corte nos subsídios ou a redução do tempo durante o qual são pagos.
  
Mas felizmente o nosso ministro Gaspar tem o dom da infalibilidade, se tivesse ido para padre toda a sua vida seria o treino desse dom para o caso de vir a ser papa. Todos os indicadores conduzem ao sucesso da sua política, seja o elevado nível da contracção da actividade económica ou o aumento do desemprego. Tudo tem explicação científica, tudo estava previsto, tudo está em linha com o previsto, o Gaspar nunca mente, nunca falha, nunca se engana. Cede um pouco na questão do desemprego e diz-se surpreendido porque em cinco meses teve de fazer três previsões da taxa de desemprego.
  
Graças ao Gaspar somos um povo feliz, podemos passar fome mas damos graças a Deus porque essa fome é um pequeno castigo face aos pecados que cometemos no tempo de Sócrates, podemos ir para o desemprego mas teremos aí a oportunidade da nossa vida, talvez venhamos a ser donos de uma multinacional de sandes de courato, podemos ter de fechar a empresa mas podemos ficar descansados porque daqui a dois anos tudo será melhor.
  
O Gaspar nunca se engana, nunca disse que a recessão ficaria abaixo dos 3% em 2012, que este seria o ano da inflexão e que em 2013 haveria crescimento económico, que o desemprego ficaria abaixo dos 14%. O homem é um técnico de mão cheia e de uma honestidade acima de qualquer suspeita, nunca se engana e nunca aldraba.