quarta-feira, março 06, 2013

Revoluções (2) - o estado social


O chamado estado social não é apenas uma evolução civilizacional e muito menos uma retribuição aos pobres pelo seu bom comportamento laboral e fiscal como decorre das palavras do representante do FMI na troika, que disse que se os portugueses queriam um estado social teriam de o pagar.

O que o senhor Salassie disse não é mais do que o argumento dos alemães que, entretanto, foi adoptado por uma direita portuguesa habitualmente pouco dotada intelectualmente e escassa de ideias. O que eles dizem aos pobres é que se querem saúde, ensino e segurança social então que trabalhem muito, portem-se bem e ganhem pouco.

Fica-se com a ideia de que se o país não tem recursos para sustentar o Estado social é porque os pobres se encheram com as fraudes que levaram todo o sistema financeiro nacional à bancarrota ou quase, é porque os pobres fogem com os seus ordenados mínimos para a zona franca da Madeira e não pagam impostos, é porque para declararem os seus quinhentos euros mensais têm de ser chamados três vezes à PJ como um conhecido banqueiro.

As nossas empresas são muito bem geridas, os nossos empresários apostam na inovação, no design, nas novas tecnologias, a nossa direita governou sempre de forma pouco exemplar e aproveitou todas as oportunidades para liberalizar a economia. O problema do país é dos governos da esquerda e dos trabalhadores, principalmente destes pois são gandulos, mal formados, improdutivos, é por causa deles que as empresas não são competitivas e o estado está à beira da bancarrota.

São estes os pressupostos de uma política que assume uma dupla função, tem objectivos económicos ao mesmo tempo que é uma punição para os mais pobres por terem abusado do consumo e dos benefícios sociais, por terem ganhos ordenados chorudos e por fugirem sistematicamente ao fisco. Há que lhes cobrar o IVA na bica, obrigá-los a trabalhar mais horas e mais dias, retirar-lhes aquilo a que se habituaram a pensar que eram conquistas.

Graças à chantagem da troika o povo anda assustado e acabrunhado, anda como nunca deveria ter deixado de estar, se não fosse o famigerado estado social hoje o Dias Loureiro ainda jantaria em Belém, o Oliveira e Costa um banqueiro bem sucedido e o BPN um dos nossos melhores bancos. Já não foi possível salvar o BPN, mas ainda se foi a tempo de salvar os anéis de muitos dos seus sócios e de meter o povo na linha. O que se gastava no estado social é melhor investido na competitividade, que nos tempos que correm significa o bolso dos banqueiros.

Esta direita burra e arrogante ainda, convencida de que é poder por uma questão de ordem natura e considera a democracia uma brincadeira para entreter o país, não percebe que o estado social é muito mais do que um estorvo, é o travão à conflitualidade social. O estado social não é apenas um progresso ou uma conquista colectiva, é a contrapartida dada aos mais pobres para que uns quantos ricos possam continuar a gozar a maior parte da riqueza produzida pelo país em tranquilidade e segurança.

Tiram o estado social aos que mal ganham para comer e só faltará tirar-lhes a vida o que, aliás, em muitos casos é mesmo o que sucede. Tirem o estado social aos pobres e estarão a abrir as portas às revoluções.