sábado, junho 21, 2014

Intelectuais da (e em) pelota

Há pouco tempo Jorge Jesus naquela sua linguagem simples indigna-se porque um médico andava por ai a falar de futebol quando ele não falava de medicina. No seu raciocínio simples isto de saber de bola exige o equivalente a um curso de medicina e duas décadas de experiência clínica, até porque médicos e especialistas de outras ciência há muitos mas treinador campeão só há um.
  
Ainda bem que nem todos somos como o Miguel Relvas senão nos próximos tempos umas boas centenas de portugueses iriam pedir o diploma de licenciatura de treinador de futebol, tantas são as aulas práticas e teóricas a que todos assistimos. São dezenas de comentadores, jornalistas, ex-jogadores, treinadores na reforma ou desempregados, ex-árbitros, massagistas, especialistas em medicina desportiva e até políticos falhados a comentar futebol, que ao fim de um mês todos somos especialistas. 
  
Não há português que já não conheça em pormenor a anatomia do joelho e do traseiro, todos sabemos o que é uma tendinose e, em particular, a tendinose rotuliana, sabemos distinguir a tendinose da tendinite e conhecemos de gingeira os métodos de tratamento e cura. Mais uns dias e somos enciclopédias de penteados masculinos e potenciais desenhadores de tatuagens, campeões em cabeçadas e especialistas em cotoveladas.
  
Mas o que mais me diverte no meio de toda esta loucura é o ar sério e compenetrado com que alguns jornalistas se pronunciam sobre a ciência. Aprecio especialmente o ar sério e quase científico com que um jornalista da TSF se pronunciam quando vai fazer os seus comentários na televisão. Todo ele é seriedade, mede cada palavra como se estivesse explicando a fórmula da teoria da relatividade, quando se pronuncia fica-se com a impressão de que atrás de cada palavra estão anos de estudo de uma ciência que só está ao alcance dos fora de série.
  
Aliás, esta versão científica do comentário espalha-se cada vez mais, cada pontapé merece explicação científica, as estratégias são dignas de um marechal de West Point, cada jogador é um misto entre Rambo, Einstein e Rudolf Nureyev. Há mesmo um conhecido comentador que não se fica pela ciência, mistura o amor, ainda no último jogo da Costa Rica com a Inglaterra entendi porque razão na percebia muito desta ciência, é por que não amo perdidamente o futebol, não o sinto como paixão e isso tolda-me a vista e a inteligência.